Taxas de despesas ordinárias devem ser iguais para todos os condôminos
Fonte: Consultor Jurídico
Taxas condominiais que cobrem despesas ordinárias devem ser iguais para
todas as moradias. Com base nessa tese, a juíza Cláudia Costa Cruz Teixeira
Fontes, da 5ª Vara Cível da Comarca de Belo Horizonte, declarou nulas duas
cláusulas da convenção de condomínio de uma edificação no bairro Lourdes,
na capital mineira, que se referiam à cobrança diferenciada para as unidades de
cobertura de despesas ordinárias de natureza administrativa, operacional, de
pessoal e de conservação e manutenção de áreas comuns.
Segundo a decisão, os critérios de rateio proporcional à fração ideal devem ser
mantidos apenas para as despesas relativas ao seguro da edificação, ao fundo de
obras e às benfeitorias estruturais, que variam conforme o valor ou o tamanho
do bem ou que valorizam o imóvel proporcionalmente, bem como despesas de
consumo de água e gás, enquanto não houver medição individualizada desses
serviços.
Além disso, o condomínio foi condenado a restituir ao condômino autor da
ação os valores pagos a mais, da data da assembleia realizada para revisão da
convenção de condomínio (17.ago.2020) até a data da efetiva implementação
da nova forma de cobrança, de forma simples. Esse montante deve ser
calculado na fase de liquidação de sentença.
Questionamento
O condômino é proprietário da cobertura, uma das 16 unidades autônomas do
condomínio réu, que corresponde à fração ideal de 11,7831% da totalidade do
terreno. O morador alegou que, pelo critério adotado para o rateio das despesas,
vem sendo prejudicado, pois os gastos com portaria, segurança, limpeza,
administração e manutenção de áreas comuns beneficiam todas as unidades de
maneira igualitária, independentemente da área privativa de cada uma.
De acordo com o condômino, houve uma tentativa de solucionar a questão
administrativamente, por meio de assembleia geral extraordinária. No entanto,
a alteração do critério de rateio foi rejeitada, levando o morador a ajuizar a ação.
O condomínio defendeu a validade da convenção condominial e a legalidade
do critério de rateio por fração ideal, argumentando que o condômino, ao
adquirir o imóvel, tinha ciência das normas e aderiu a elas livremente. Outro
aspecto ressaltado na contestação foi que a alteração da convenção depende da
vontade da maioria qualificada dos condôminos, o que não foi obtido em
assembleia.
Ainda segundo o condomínio, a cobertura possui área superior à das demais
unidades e características diferenciadas, como piscina privativa e espaços de
lazer exclusivos, o que requer maior esforço de manutenção estrutural do
edifício, justificando a cobrança proporcional.
Decisão
Segundo a juíza, a lei civil confere à convenção de condomínio a prerrogativa
de estipular a forma de rateio, mas “essa autonomia privada coletiva não é
absoluta e não pode servir de escudo para a perpetuação de situações de
flagrante iniquidade ou abuso de direito”.
A magistrada citou laudo pericial que, ao analisar a documentação financeira do
condomínio e a estrutura de custos, confirmou que a cobertura contribuiu com
valor aproximadamente 101% superior às demais unidades, devido à sua fração
ideal, mesmo no caso de despesas que possuem natureza de fruição igualitária.
Isso inclui salários de funcionários e encargos trabalhistas, materiais de limpeza,
manutenção de elevadores e de portões eletrônicos, sistemas de segurança,
despesas administrativas com escritório de contabilidade e honorários de
síndico.
Assim, ela concluiu que a imposição de pagamento dobrado por esses serviços
configura enriquecimento sem causa da coletividade dos demais condôminos
em detrimento do condômino que paga.
“A soberania da assembleia condominial, que rejeitou a alteração da convenção,
encontra limites na vedação ao abuso de direito. Ao imporem à minoria (no
caso, uma única unidade) um custo desproporcional que desonera a maioria, os
condôminos agem em excesso de poder, passível de correção judicial”, afirmou
a juíza Cláudia Fontes.
Entendimento do STJ
A partir dessa conclusão, a juíza Cláudia Fontes aplicou entendimento do
Superior Tribunal de Justiça em caso análogo, no julgamento do Agravo Interno
no Agravo em Recurso Especial nº 1.837.019/AL, tomando a decisão como
paradigma.
O precedente do STJ reforça a possibilidade de afastamento do critério da
fração ideal quando este se revelar abusivo e gerador de enriquecimento ilícito
para despesas que não guardam proporcionalidade com a área da unidade.
“O julgado referenciado destaca que a cobrança de taxa condominial calculada
com base na fração ideal se revela abusiva e injusta quando onera em demasia
o condômino de maior proporção em benefício dos demais, especificamente
para gastos com asseio, conservação, reparação de dependências comuns e
pagamento de funcionários”, ponderou a magistrada.
Segundo a juíza, a perícia comprovou que há despesas nas quais o critério da
fração ideal se justifica. Assim, ela estabeleceu um critério de rateio híbrido:
igualitário para despesas de pessoal, administrativas, de conservação de áreas
comuns e manutenção de equipamentos de uso geral; e mantido pela fração
ideal para despesas de consumo (água e gás, na ausência de hidrômetro
individual) e fundo de obras/benfeitorias que agreguem valor ao imóvel
proporcionalmente à sua fração, bem como o seguro predial.
A decisão também determinou a devolução da quantia paga a mais pelo
condômino, retroativa à data da assembleia realizada para revisão da convenção
de condomínio, mas de forma simples, e não em dobro, uma vez que a cobrança
estava amparada em cláusula de convenção condominial vigente. A decisão está
sujeita a recurso. Com informações da assessoria do TJ-MG.
Processo nº 5004979-73.2021.8.13.0024